16.1.11

Considerações vãs acerca da fraqueza humana

Calma, ome. Eu estava viajando e agora estou estudando pro vestibular. Quer dizer, eu não estudo pra vestibular, nem pra prova nenhuma, estudo pra mim. Se bem que eu preciso de algumas motivaçõezinhas, mas tá.
Uma coisa que eu sempre tive receio de comentar, muitas vezes com medo de ofender alguém, é a religião. Um assunto delicadamente controverso e que não adianta discutir. Tenho uma amiga adventista que guarda o sábado, não come carne de porco, dentre outros e que critica a minha avó que é testemunha de Jeová e não faz transfusão de sangue nem comemora aniversário, e que rebate que não comer porco fazia parte da lei do antigo testamento que foi abolida e ambas criticam os católicos que veneram imagens, e qualquer católico vai dizer que as imagens são meramente simbólicas. Todos eles inflexíveis. Uns dizem que tá certo, outros dizem que não. Eu não consigo fazer parte da igreja católica, que durante a sociedade feudal monopolizou o conhecimento e suprimiu toda a herança grega, colocando medo na população; e depois fez as cruzadas, para combater os muçulmanos e instalar o que julgavam ser o certo. Também não consigo ser protestante, uma doutrina que desde a sua fundação sofreu muitos desvios e já não tem mais a essência original; novas igrejas protestantes se proliferam a cada dia e são constituídas em grande parte por ex-católicos arrependidos ou pessoas que tiveram algum tipo de problema (não que todos sejam assim). Religião é uma coisa que gera uma desunião nada saudável na população, e devia ser o contrário, ela devia unir as pessoas através do amor, mas os cristãos brigam entre si, cristãos brigam com muçulmanos, que brigam com judeus. Todos defendendo o que julgam ser o certo e crentes na sua salvação. Salvação. Uma testemunha de Jeová me disse que no céu só tem vaga pra 144 mil pessoas, e o resto vai ficar na Terra, que vai ser um lugar bom. Eu acho uma coisa muito simplista a história de céu e inferno, de bem e mal, pra mim a linha entre eles é muito tênue e difícil de definir. Acho que ao invés de nos preocuparmos com a nossa suposta salvação após a morte, deveríamos nos preocupar com a nossa salvação agora, porque podemos fazer do nosso mundo um paraíso. É assim que eu interpreto o apocalipse, porque quem constrói a nossa sociedade somos nós e cabe a nós melhorá-la. O paraíso pode ser aqui na Terra, ele pode ser hoje se a gente quiser.
A religião é uma necessidade humana; a humanidade é fraca demais pra ter chegado aqui sem ela, toda sociedade tem seus deuses, e uma coisa que os homens vão aprender no futuro é a se valorizar mais. Não tenho religião porque não me adequo a nenhuma, mas tenho religiosidade. Não sei se Deus existe ou não, mas acho plenamente possível que sim. Li uma historinha num livro, infelizmente não consigo lembrar o nome, que dizia que um astronouta viajou pelos céus, visitou atros, e mesmo assim não conseguiu ver nenhum deus; e um neurocirurgião que conversava com ele e disse que já havia operado muitos cérebros e nunca tinha encontrado nenhum pensamento.
Eu já comecei a ler a bíblia, e a cada palavra que eu lia, mais fé eu perdia. Isso porque eu não consigo não ter uma visão crítica da bíblia. Dizem que não se deve questionar, mas apenas acreditar, mas eu não penso assim, não tenho Deus como uma espécie de ditador. A bíblia é muito importante, mas não creio que deva ser absoluta, não é bom nos prendermos a uma coisa só.
Essa é a minha singela visão. Não sei se estou certo, não sei se é assim, é só o que eu penso. Eu sonho com um mundo mais unido, menos individualista e menos egoísta, e sei que não agrado muita gente com o que eu disse, mas eu não trato ninguém com diferença, nós não podemos amar o pecado, mas devemos amar o pecador. E mesmo assim, viu, acho o pecado uma coisa muito subjetiva. Por que pecado se tudo o que fazemos é natural? Felizes são os animais selvagens, que apenas vivem, não têm civilização, ética, moral e não estão tão sujeitos à vontade humana como os domésticos. Seria bom se eu fosse um bicho, às vezes eu não me sinto bem por ser homem e me canso da humanidade. A realidade pra mim é irreal demais, mas tá.

8.1.11

232,7° C

Seu Toba me falou de um livro chamado Fahrenheit 451. Pois sim, eu vi o filme há uns dias e posso dizer que é bom com algumas ressalvas. É claro que ele tem uma mensagem realmente muito interessante e nos alerta sobre o nosso papel ativo/passivo em relação à sociedade e a nós mesmos, mas esse é um dos pontos. O filme que eu vi fala sobre um futuro onde os livros são proibidos e a sociedade é extremamente hipnotizada pela tevê. Então, ele me deu uma impressão um pouco leve, mas ainda forte, daquelas histórias com lição de moral, como um pai falando pro filho.
-- Olha, garoto, televisão é do capeta.
É evidente que eu não vou questionar a importância da leitura, ela foi muito importante pra mim, afinal. E também não vou defender a tevê, muito menos essa coisa alienadora e que vocês chamam de Globo e afins. Mas me digam se a leitura também não é uma atividade passiva, e se a questão é absorver conhecimento e cultura a boa televisão não pode desempenhar um papel semelhante? É um ponto delicado, como eu já disse, a inutilidade está nas pessoas e não nas coisas. Eu acho que o meu exemplo ilustra bem isso. Eu cresci numa casa muito comum de classe média. Na minha família ninguém tinha o mínimo interesse por leitura eu passava quase oito horas por dia vendo tevê. Até que eu descobri os livros, no início timidamente, mas depois eu passava a ler cada vez mais e devo agradecer por minha escola ter uma biblioteca rica. Então, em vez de passar as noites vendo novela, eu lia. E esses best-sellers que a maioria dos sábios condena foram a minha porta de entrada para outros livros, literatura de verdade, hoje eu tenho que convir. Por isso eu não gosto de condenar esses livros, nem a televisão. Agora é realmente ruim que não se descubra algo de mais qualidade nem uma tevê melhor. Pensem bem, a televisão integra o mundo com uma força enorme e é o meio de comunicação mais influente do planeta. Mas o problema é quando ela te hipnotiza demais, e por isso é bom abrir a discussão, mas não é legal ficar nessa coisa rasa de falar livro é bom, tevê é ruim. Tá parecendo Nietzsche, que não encontrou a real essência da fraqueza humana e resolveu condenar o cristianismo, olha lá, galerinha, não é assim que se chega lá.
Agora outras coisas menores que notei no filme. Primeiro duas coisas que se referem à tradução e isso é muito delicado, oh, Deus. O título. Bem, ele é a temperatura de combustão do papel dos livros, mas a escala fahrenheit não é usada no Brasil e por razões estéticas a original foi mantida, o que é uma pena porque o efeito que se quer não é atingido, e isso é realmente um impasse pra quem traduz, mas mesmo assim isso ainda me parece furado. Não existe uma padronização pra livros, eles são feitos com diversos papéis que naturalmente têm temperaturas de combustão diferentes, sem contar as capas.
O segundo ponto sobre a tradução se refere aos bombeiros, que nessa história, em vez de apagar o fogo, queimam os livros proibidos. A fala de uma personagem chamou minha atenção.
-- É verdade que, há muito tempo, os bombeiros apagavam incêndios ao invés de queimar livros?
Na língua portuguesa a palavra bombeiro está relacionada diretamente com a água, e é, inclusive, o mesmo nome daquele cara que vai à sua casa quando um cano estoura. Diferentemente do inglês, em que fireman não remete a nada além do fogo. Então o nome em português dos bombeiros nesse futuro catastrófico teria que ser outro, a não ser que essa coisa da dominação seja tão forte que questionamentos como esse aí da moça não tenham nenhum fundamento linguístico, o que é mais provável. Mesmo assim, a palavra merece uma nota no caso do livro.
Agora sobre o filme, eu tenho que dizer que eles fracassaram na tentativa de criar um futuro onde um monotrilho suspenso convive com um telefone analógico. É realmente o lado negativo de tentar prever uma coisa impossível. Numa época onde os computadores eram impopulares e nem sei se a internet já existia, não dava pra prever que se poderia ler livros no PC, muito menos num aparelho como o iPad, que é uma revolução no modo de ler. Agora só nos resta esperar pelos carros voadores enquanto assistimos a mais filmes do tipo Mãe Diná.
E o filme também poderia ter explorado melhor a questão da dependência que a televisão causava nas pessoas, poderia ter expandido mais o nosso campo de visão. Senti falta de panoramas gerais da sociedade, exemplos de outras famílias e instituições, coisas que mostrassem e enfatizassem de que forma era feita essa domesticação da civilização e de que forma a civilização reagia a isso. Ah, e quero lembrar também que só vi o filme, então não estou falando nada do livro, que aliás deve ser bem melhor. Dá pra notar que é uma adaptação difícil de fazer, e é essa incompreensão que é responsável por muitos fracassos.
Mas também tenho visto alguns filmes bons nessas férias. Ontem vi um chamado Maurice que gostei bastante, e uma versão pouco conhecida de O Morro dos Ventos Uivantes que é bem interessante. Agora estou viajando, vou me afastar literalmente da civilização e aproveitar pra estudar, ler um pouco, e passear pelo campo. Vejo vocês logo.

Page copy protected against web site content infringement by Copyscape