19.9.12

Pequena crônica da alegria instantânea

Um punhado de estresse pode estragar o seu dia, mas uma gota de alegria certamente o torna muito melhor

Chamaram o moleque de gordo, ele realmente estava. Gordo era exagero, vá lá, mas magro também já deixara de ser há tempo. Ele começou a fazer uma dieta, desde então só pensa em comida e fome é uma palavra muito sensível no seu cotidiano. Tentava distrair a cabeça, tentava pensar em outra coisa, qualquer coisa... O peixe  de estimação do seu primo servia, mas só conseguia imaginar ele frito. Começou a fazer caminhadas, mas levou um bolo do seu amigo. Tem nem motivação, né irmão. Nos dois últimos dias ele se estressava com tanta facilidade; uma mensagem não respondida, qualquer coisa que não dava certo. Não sei o que é, se eram os outros que realmente mereciam sua raiva ou se tudo isso era sem razão. Mas ele sabia que independentemente disso não fazia bem pra ele o sentimento. Ainda assim não queria reprimir, não queria guardar no coração, melhor sair do que ficar, né, pôr pra fora o que te faz mal. (e se isso faz mal pros outros?)
Mas bom se acontece qualquer coisa que o deixa melhor. Aí ele pegou o ônibus. Tá demorando de passar... merda. Tá lotado... caralho. Senta na frente, fica mais perto do motorista, vai vendo as coisas de outro ângulo, nunca tinha sentado ali antes, que legal, vejo melhor os pontos, nossa, quantas pessoas batem a mão pra ele parar, vê como ele controla tudo, tantos botões, curva por ruas estreitas, abre portas, olha pelo retrovisor pra fechá-las na hora certa e não machucar ninguém, sempre responsável, respeitando o sinal, sem pressa. De repente começaram a acontecer coisas divertidas no trajeto. Um moleque queria pegar o ônibus no ponto errado, e o motorista, gentilmente, disse pra ele ir pro ponto de trás. O trânsito começou a pesar. Quando me dei por mim o ônibus tinha parado transversalmente na avenida Afonso Pena, fechando um dos sentidos dela completamente.
- Ê, Wilson, fechou o trânsito, hem!
Disse o cobrador, irreverente, e depois os dois começaram a rir, tentando entender o que acontecia na rua dos Caetés e ao mesmo tempo não dando a mínima pra rua fechada e pros carros afunilados no cruzamento. Os motoqueiros passavam pelo espaço mínimo entre o ônibus da frente e o meu. Os outros carros buzinavam e vez ou outra eles reclamavam de leve.
- Cadê a BH Trans nesses momentos?
Agora pausa para um momento traquino, e certamente o ápice do dia. A pedido do trocador, insistente e sorridente, o motorista fechou uma mulher estridente que achava que seu carro tinha o poder da Lince Negra.
- Abre a porta, agora, abre! - ele parecia um menino de 12 anos.
Tsssssssssss. E os passageiros começaram a entrar, fechando e irando ainda mais a mulher. E a gente se divertindo lá dentro do ônibus... Depois passei pela roleta. Não tinha troco pra mim. Mas com toda aquela simpatia.
- Posso te dar o troco depois?
Claro que pode.
- Onde você desce?
- Na Floresta.
- Beleza!
Dentro do ônibus me ofereci pra segurar a mochila de uma menina bonita que estava vestida de azul. Não era uma camisa do Cruzeiro. Mas tinha um cara com a camisa do Galo bem do meu lado. Não podia ser perfeito, né. Na hora de descer nem me dei conta que tinha esquecido de pegar o troco. 
Não faz mal, tinha comprado meu dia.

2 comentários:

  1. Texto tão simpático quanto a história contada nele!

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  2. Que trem mais lindo. E em plena correria do dia-a-dia abstrair-se e se encantar com coisas assim HAHAUAHUA E o final valeu a crônica toda!

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