28.11.10

O drama de Nohanna

Um cão é realmente a melhor companhia que se pode ter. Talvez se falassem não poderiam ser melhores. É bom estar perto deles, silenciosos, serenos e sempre companheiros. É bom brincar com eles e correr com eles; ensiná-los truques e dar um petisco quando te olham com aquela cara de pidão, ou dar um afago quando te olham com a mesma cara de pidão. Ter um cão é como ter um filho, você precisa cuidar, amar, alimentar, vacinar; a diferença é que quando você chama seu cão ele vem, e quando você chama seu filho ele diz "Já tô indo" ou "Peraí".
Recentemente a minha cadela teve bebês e eu pude multiplicar a sensação de ter um cão por nove. Nove bolinhas de pelos cegas se arrastando e miando (porque eles miam quando nascem) em busca da teta da mãe. Mãe de primeira viagem; ela pariu no quintal e levou os filhotes pro meio de umas galhas da goiabeira que tinha sido podada. E deu bastante trabalho pra mudá-los de lugar, já que ela sempre os trazia de volta; até que ela própria percebeu que a caminha que eu fiz era melhor que um monte de galhas secas ao sol.
E eu também era um dono de primeira viagem. Quando cheguei da escola 1h da tarde, havia três; e eu achei que fosse parar por aí, mas de repente vi ela se agachando e uma bolsa negra saindo de dentro dela, aí ela comeu isso e pegou pela boca uma criaturinha esperneante. Esse foi o único parto que eu presenciei; e quando saí para o segundo turno das aulas às 3h30 já havia nascido mais um. Quando cheguei a família já estava completa. O trabalho de parto durou ao todo mais de sete horas.
Eu fiquei muito bobo, acho que é essa a sensação quando se tem um filho, sei lá. Tinha um que nasceu muito pequeno e magro, ele cabia na palma da minha mão, e eu cuidava sempre pra que ele mamasse direitinho. Ele ficou forte e saudável e eu acabei me apegando a ele. Na verdade me apeguei a todos. Nove monstrinhos correndo atrás de você e fazendo do seu quintal um campo-minado. Hoje só tem quatro aqui comigo, eles já estão com mais de 40 dias e precisam ir pros seus novos lares. Não teria coragem de vender nenhum, sempre achei isso um absurdo, vender uma vida, ainda mais uma vida tão importante como a de um cão. Dei todos para pessoas que sei que cuidarão bem. Dá saudade, mas simplesmente não dá pra sustentar 10 cães de grande porte aqui em casa, ninguém ia aguentar. Fiquei com um. Por mim teria ficado com o pequeno, que eu chamava de Besouro por causa dos olhos dele; mas meus dois irmãos escolheram o maior e mais bonito, e como eles são mais novos, não quis caçar briga.
Enfim, pra mim ter um cão é muito bom, ter dois pode ser melhor. Mas eles são bichos que precisam de atenção e cuidado, por isso não é qualquer um que está apto a tê-los, e não é à toa que inúmeros vira-latas são marginalizados nas ruas. Um cão não é um brinquedo, que você larga num canto depois que cansa de brincar. Ele é acima de tudo, alguém como eu e você, ou talvez até melhor.

P.S.: O título da postagem se deve a uma garota da minha escola que tem esse nome bonito. Um dia estávamos na biblioteca e a colega dela chamou "Nohanna, vamo logo que o professor já tá na sala!" e elas saíram num desespero. Talvez eu esteja fazendo um drama exagerado, tendo que limpar as belas obras que esses bichos fazem, alimentá-los, vermifugá-los, enfim. Acho que já dá pra fazer uma novela mexicana. Vou chamar Jane Carmen para o papel principal.

16.11.10

Viva a vagabundagem

Ah, o trabalho. Aquele que nos enobrece, que ocupa nossa mente e nosso tempo, que garante o nosso sustento, que faz de nós quem somos. Ah, a ilusão. Aquela que nos engana, que nos faz pensar que pensamos.
(epígrafe só pra ficar chique, eu mesmo que fiz :P)

O papel do trabalho nas nossas vidas hoje parece ser inquestionável. Trabalhamos porque precisamos trabalhar. Será mesmo? Em partes sim. Na nossa atual forma de organização social seria impossível viver sem ter alguma ocupação. Mas o trabalho não é absoluto. Ele não pode ser. O que há é uma supervalorização do trabalho e uma marginalização do ócio. Quero crescer, quero entrar numa boa universidade, quero me formar, quero trabalhar. Mas e aí? O que vai ser depois? Nossa vida parece ter um objetivo e só. O ócio não faz mal pra ninguém, ele ajuda você a se conhecer melhor, ajuda na tranquilidade, ajuda na reflexão, na opinião, enfim.
Mas as relações do trabalho com as pessoas é mais complexa do que simplesmente dedicar mais tempo a si próprio. Há pessoas que realmente não podem fazer isso, infelizmente. Pessoas que têm dois empregos ou mais, que trabalham nas horas vagas pra ajudar no sustento da família, que se cansam tanto que só querem chegar em casa e descansar.
Então estamos aqui de novo nos perguntando se os pobres são pobres porque têm muitos filhos ou se têm muitos filhos porque são pobres.
O trabalho só dignifica o homem se ele tiver dignidade o bastante pra trabalhar sem ser trabalhado. E para aqueles que não podem, nos pesa a responsabilidade. A sociedade exige demais de nós. Vamos exigir mais dela.

12.11.10

Utilizemos a cultura inútil

Tem muito velho chato por aí e alguns jovens idosos também, dizendo que ver novela, Big Brother, A Fazenda e afins é coisa inútil e que nunca deve ser feito. Pois eu digo que não existe cultura inútil. Por menos preenchido que alguma coisa seja, nesse caso, nada é completamente vazio. Quem é curioso mesmo vai saber tirar proveito de qualquer merda. O Big Brother por exemplo, é um prato cheio pra filósofos, que podem observar e analisar a socialização humana em grupos isolados. Na nossa vida cotidiana, nós não temos essa oportunidade, já que não estamos presos e nosso comportamento sofre sutis alterações quando passamos a estar. Ver novela pode ser bom, porque se descobre as características da nossa teledramaturgia, melhor ainda pra quem é da área. Enfim, tem gente aí se achando inteligente demais pra programas assim e dizendo que o brasileiro não merece isso. Pois eu acho que merecíamos coisa pior e estamos ganhando até demais. A inutilidade está nas pessoas e não nas coisas. Mas isso não quer dizer que as pessoas devam assistir. Eu mesmo já perdi o interesse por novela e pela maioria dos reality shows, mas não desconsidero quem gosta. Não ia achar legal se me tratassem com preconceito só porque eu assisto meus programas de doido no Futura. Mas eu vejo Ídolos e acho que esse devia ser o palco para a revelação de novos talentos, porque lá vozes incríveis cantam boas músicas do cenário nacional. Mas é assim mesmo, o mundo está cheio de coisas fantásticas que ninguém conhece, e o não estar na moda está na moda.
A gente merecia mesmo coisa muito pior.


7.11.10

E(nem)

Amigos, estou exausto. Sinto que minha cabeça vai explodir. Isso depois de 10h de provas divididos em dois dias. Tudo pra descobrir que uma coisa grande demais tende a ser desastrosa demais.
Quem ouve o governo fazer sua propaganda de integração, mais oportunidades e fim da decoreba com o novo enem, basta fazer a prova pra ver que não é bem assim. No primeiro dia faltava uma questão na prova amarela, não foi o meu caso, mas causou confusão; e no cartão de respostas as questões de Ciências da natureza e Ciências Humanas estavam invertidas, além da prova ser grande demais. No segundo dia não houve problemas técnicos, mas de novo uma prova grande, cansativa, com cálculos longos e pouco tempo. Hoje entreguei a prova no último minuto e adoraria dispor de algumas questões a menos. Esse discurso de integração é falho, veja o exemplo da minha colega. Ela fez o enem no ano passado (quando a confusão foi muito maior) e foi aprovada em três universidades: Pelotas, Mato Grosso e outra que não me lembro. Ela não tem o mínimo interesse de ir pra esses lugares, que são longe da família dela, além de haver problemas óbvios pra ela se manter nessas cidades.
A grandiosidade do novo enem faz com que ele tenha problemas inevitáveis. Primeiro, a questão do fuso-horário. Se os acrianos existissem eles iriam fazer a prova às 11h da manhã, que iria se estender até a hora do almoço, o que seria muito desconfortável pra eles que teriam que alterar sua rotina. Segundo, as questões de segurança. Os aplicadores são extremamente despreparados e não há nenhuma forma de revista ou detecção de metais caso você vá ao banheiro, o que torna a cola uma questão válida. E sobre o tão falado fim da decoreba: pura balela. Há questões que sem fórmula não dá pra resolver. Dizem que essa prova explora o raciocínio dos alunos, vejam como explorou o meu:
a) 1,7 kg
b) 1,9 kg
c) 2,9 kg
d) 3,3 kg
e) 3,6 kg
Antes da vírgula os números que mais se repetem são o 1 e o 3, depois da vírgula o número que mais se repete é o 9, combinando os dois, só dá pra ser letra b.
Demais.
E a aplicadora ainda comeu meu chocolate, mas isso não foi problema da prova, mesmo eles tendo contratado aplicadores gulosos. Ela me pediu um pedaço, e como o tema da redação era O Trabalho na Construção da Dignidade Humana e eu defendi relações mais altruístas e com pensamento coletivo, não pude negar.
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